Sumários

50ª Aula – Continuação de aplicações do T. Fundamental do Cálculo para funções de várias variáveis: Existência de solução do problema de Dirichlet para equações de Poisson e Laplace em bolas de ℝn.

25 maio 2020, 11:30 Luis Magalhães

(Não houve aula presencial porque a Direcção do IST decidiu suspender as aulas presenciais devido ao surto de COVID-19. Por isso, a descrição abaixo é bastante detalhada)

Estudo para acompanhamento da matéria: pgs. 161-165 do livro Luis T. Magalhães, Integrais em Variedades e Aplicações, 2ª Edição, Texto Editora, 1999. E exercícios correspondentes.

Observação: Obtiveram-se com as fórmulas de Green resultantes do T. Fundamental do Cálculo condições para unicidade de solução (caso exista) do problema de Dirichlet para a equação de Poisson em conjuntos limitados abertos. Também com fórmulas de Green, e portanto por aplicação do T. Fundamental do Cálculo em ℝn, pode-se obter existência em conjuntos simples, o que se mostra agora em bolas.

Observação: É fácil obter soluções da equação de Laplace em todo ℝn menos um qualquer ponto com simetria radial: r2-n para n>2, e ln r  para n=2, em que r é a distância ao ponto, como se pode verificar com a Regra da Cadeia que dá lap r2-n=0 para n>2, e lap ln r=0 para n=2.

Definição: Chama-se solução fundamental normalizada da equação de Laplace em ℝn\{y}, Γ(x-y)=Γ(||x-y||) para n=2 igual a (1/2π) ln ||x-y|| , e para n>2 igual a (1/[n(2-n) voln(B1)]) ||x-y||2-n, em que B1 é a bola com raio 1 e centro 0 em ℝn.

Proposição: Para y∈ℝn fixo e x∈ℝn\{y}, DjΓ(x-y)=(1/[n voln(B1)]) (xj-yj) ||x-y||-n e DjkΓ(x-y)=(1/[n voln(B1)]) [δjk||x-y||2- n (xj-yj) (xk-yk)] ||x-y||-n-2, para j,k=1, …, n, em que δjk é 1 se j=k e 0 caso contrário, e x=(x1, …, xn) , y=(y1, …, yn) .

Em consequência, |DjΓ(x-y)| ≤ (1/[n voln(B1)]) ||x-y||1-n e |DjkΓ(x-y)| ≤ (1/voln(B1)) ||x-y||.n, para j,k=1, …, n, x∈ℝn\{y} .

(Dem.: Calcular as derivadas parciais com a Regra da Cadeia. As majorações são imediatas das fórmulas das derivadas parciais.)

Pretende-se aplicar a 2ª Fórmula de Green com g=Γ. Como Γ tende para infinito em y, considera-se a 2ª Fórmula de Green em D\(fecho de Br), em que D é um domínio regular e r>0 é suficientemente pequeno para o fecho de Br=Br(y) estar incluído em D ,

D\Br Γ lap f dVn = ∫D (Γ∇f·n - f∇Γ·n) dVn-1+ ∫Br (Γ∇f·n - f∇Γ·n) dVn-1 , em que n é a normal unitária exterior a D\(fecho de Br) na fronteira deste domínio regular.

Como | ∫Br Γ∇f·n dVn-1| = Γ(r) | ∫Br ∇f·n dVn-1| ≤ Γ(r) n voln(B1) rn-1supBr||∇f|| → 0 quando r→0 , pois Γ(r) n voln(B1) rn-1 é igual a r/(2-n) se n>2 e a r ln r se n=2 . Por outro lado,

Br f ∇Γ·n dVn-1 = - Γ´(r) ∫Br f dVn-1 = - (1/[n voln(B1) rn-1]) ∫Brf dVn-1 = - (1/[voln-1(∂B1)]) ∫Br f dVn-1 → - f(y) quando r→0 , pois f é contínua.

Aplicando estes limites na expressão anterior obtida com a 2ª Fórmula de Green, obtém-se a representação de Green para funções f C2 em D e C1 no fecho de D

f(y) = ∫D [ f(x) ∇Γ(x-y)·n - Γ(x-y) ∇f(x) ·n ] dVn-1(x) + ∫D Γ(x-y) lap f(x) dVn(x) .

Com a Regra de Leibniz verifica-se que se lap f=0 em D, então f é C em D .

Se g é C2 em D e C1 no fecho de D e lap g=0 , da 2ª Fórmula de Green, ∫D [ f∇g·n - g∇f·n ] dVn-1+ ∫D g lap f dVn = 0 . Adicionando esta fórmula à representação de Green, com G(x,y) = Γ(x-y) + g(x) , obtém-se

f(y) = ∫D [f(x) ∇G(x,y)·n - G(x,y) ∇f(x)·n] dVn-1(x) + ∫DG(x,y) lap f(x) dVn(x) .

Se G(x,y)=0 para x∈∂D, obtém-se a fórmula para funções f C2 em D e C1 no fecho de D

f(y) = ∫D f(x) ∇G(x,y)·n dVn-1(x) + ∫DG(x,y) lap f(x) dVn(x) .

Definição : A função G:{(x,y): y∈D, x∈(fecho de D)}\{y}→ℝ C2 no domínio regular D⊂ℝn, C1 no fecho de D, tal que  x↦G(x,y) satisfaz a equação de Laplace em D e G(x,y)=0 para x∈∂D, para cada y∈D fixo, chama-se função de Green para o problema de Dirichlet no domínio D, ou função de Green de 1ª espécie para D . Sabe-se do resultado de unicidade para a equação de Laplace estabelecido em aula anterior que a função de Green, quando existe, é única.

Proposição: Seja D⊂ℝn domínio regular e ρ C1 em D. Se a função de Green para o problema de Dirichlet em D existe, e f C2 em D e contínua no fecho de D é solução o problema de Dirichlet para a equação de Poisson lap f=ρ em D, f=u em ∂D, em que u é uma função definida em ∂D, então f(y) = ∫D u(x) ∇G(x,y)·n dVn-1(x) + ∫DG(x,y) ρ(x) dVn(x) .

Observação: Não consideramos a existência de função de Green com toda a generalidade possível, mas só no caso mais simples em que D é uma bola em BR=BR(0)⊂ℝn .

Proposição: G(x,y) igual a Γ(||x||) - Γ(R) se y=0 e a Γ(||x-y||) - Γ(||y||/R||x-y*||) se y≠0 , com y*=(R2/||y||2y , é a função de Green para o problema de Dirichlet para a equação de Poisson lap f=ρ em BR=BR(0)⊂ℝn, e satisfaz G(x,y)=G(y,x) para todos xy em BR(0) e ∇xG(x,y)·n = (R2-||y||2) / [ (n volnB1) R ||y-x||n] ≥ 0 para todos xy em BR(0) .

(Dem.: x↦G(x,y) é C em ℝn\{y} satisfaz a equação de Laplace em ℝn\{y} e é 0 para x∈∂BR . G(x,y)=G(y,x) é imediata da fórmula para G. Como G(x,y) = Γ(x-y)+g(x), é ∇xG(x,y)·n = ∇xΓ(x-y· n + ∇g(x· n = (∂G/∂||x||) (x,y) = (R2-||y||2) / [ (n volnB1) R ||y-x||n] ≥ 0 para todos xy em BR(0))

Existência de solução da equação de Laplace numa bola de n: Se B=BR(y)⊂ℝn e u:∂B→ℝ é contínua, o problema de Dirichlet para a equação de Laplace lap f=0 em B, f=u em ∂B tem solução única em C2(B)∩C0(∂B) , dada por f(y)=(R2-||y||2)/[(n volnB1) R] ∫Bu(x)/||y-x||n dVn-1(x) se y∈B, chamada Fórmula Integral de Poisson para f .

(Dem.: Seja G a função de Green para o problema de Dirichlet para a equação lap f=0 em B . É  lapxG(x,y)=0 e lap ∇xG(x,y)·n =0 (em que o subíndice x assinala as variáveis em relação a que se calculam as derivadas parciais), da Fórmula Integral de Poisson f(y)= ∫B K(x,y) u(x) dVn-1(x) , com K(x,y) =(R2-||y||2) / [(n volnB1) R ||y-x||n]  a que se chama núcleo de Poisson.  Com a Regra de Leibniz obtém-se que lap f=0 e f é C em B. É imediato que ∫B K(x,y) dVn-1(x) = (R2- ||y||2) / [(n volnB1)R] ∫B 1/||x-y||ndVn-1(x) = 1 (da Fórmula integral de Poisson para f constante igual a 1). Também, se y0∈∂B e {ym} é uma sucessão de pontos em B tal que ymy0, então f(ym) →f(y0) . Resta provar que f é contínua em ∂B. Para ε>0 e y0∈∂B arbitrários, como u é contínua em ∂B, existe δ>0 tal que ||u(y)-u(y0)||<ε para y∈∂B tal que ||y- y0||<δ e como ∂B é compacto e |u| é contínua em ∂B, a função |u| tem um valor máximo M em ∂B . Logo, se ||y- y0||<σ com σ<δ/2 , com é |f(y)-f(y0)| = | ∫B K(x,y) [u(x)-u(y0)] dVn-1(x) | ≤ ∫B∩Bδ(y0) K(x,y) |u(x)-u(y0)| dVn-1(x)| +| ∫B\Bδ(y0) K(x,y) [u(x)-u(y0) ] dVn-1(x) | ≤ ε + ∫B\Bδ(y0) K(x,y) 2M dVn-1(x
e ∫B\Bδ(y0) K(x,y) 2M dVn-1(x) ≤ 2M ∫B\Bδ(y0)K(x,y) dVn-1(x) = 2M ∫B\Bδ(y0)  (R2-||y||2) / [(n volnB1) R ||y-x||n] dVn-1(x) ≤ 2M(R-||y||)(R+||y||)/[(n volnB1)R] ∫B\Bδ(y0) 1/(δ/2)ndVn-1(x) ≤ 2M2Rσ/[(n volnB1)R] ∫B\Bδ(y0)1/(δ/2) dVn-1= 4Mσ/[(n volnB1)(δ/2)n-1] voln-1(∂B) = (4Mσ/[(n volnB1)(δ/2)n]) Rn-1n voln(∂B1) = σ4M Rn-1/(δ/2)n. Se σ>0 é suficientemente pequeno, |f(y)-f(y0)|≤2ε , pelo que f é continua em todo y0∈∂B.)

Observação: Para o problema de Dirichlet numa bola B para a equação de Poisson lap f=ρ em B, f=u em ∂B, com ρ C 1 no fecho de B e u contínua em ∂B também se obtém existência (e já se sabia unicidade) de solução, e a solução pode ser expressa pela representação dque foi obtida, como soma de um integral em ∂B que envolve o núcleo de Poisson e u e um integral em B que envolve a função de Green correspondente e ρ (na forma usual de solução geral de equações lineares como somo da solução geral da equação homogénea correspondente, que é a equação de Laplace, e  neste caso tem solução única, e uma solução particular da equação não homogénea). (Ver no livro pgs, 166-168).


Exercícios da ficha 13 e do 1º mini-teste (aula online)

25 maio 2020, 10:00 Manuel Paulo de Oliveira Ricou

Exercício 3 do mini-teste.

Ficha 13: exercícios 1, 3, 6
Apontamentos


49ª Aula – Continuação de aplicações do T. Fundamental do Cálculo para funções de várias variáveis: Propriedade de valor médio para funções harmónicas. Princípio de Máximo Forte e Fraco para soluções de equações de Poisson e Laplace. Extensão da unicidade de solução do problema de Dirichlet para as equações de Laplace e Poisson em conjuntos abertos limitados C2 no conjunto e contínuas no seu fecho.

22 maio 2020, 11:30 Luis Magalhães

(Não houve aula presencial porque a Direcção do IST decidiu suspender as aulas presenciais devido ao surto de COVID-19. Por isso, a descrição abaixo é bastante detalhada)

Estudo para acompanhamento da matéria: pgs. 158-161 do livro Luis T. Magalhães, Integrais em Variedades e Aplicações, 2ª Edição, Texto Editora, 1999. E exercícios correspondentes.

Observação: Em aulas anteriores referiu-se que em certas aplicações a equação de Laplace corresponde a situações de equilíbrio (e.g. em movimento de fluidos, electroestática e difusão de calor), pelo que é natural que o valor de uma solução em cada ponto seja a média dos valores numa bola, ou na fronteira de uma bola, centrada nesse ponto, pois a compensação de diferenças corresponderia a não haver equilíbrio.

Teorema de Valor Médio para Funções Harmónicas (resp. sobre- e sub- harmónicas): Se u é uma função C2 definida num conjunto aberto D⊂ℝn é solução da equação de Laplace ou Poisson lap u=ρ com ρ=0 (resp., ≥0, ≤0), então para toda bola B=BR(y) com fecho incluído em D é

(1)  u(y) = (resp., ≤, ≥) [1/voln-1(∂B)] ∫B u dVn-1 .

(2)  u(y) = (resp., ≤, ≥) [1/voln(B)] ∫B u dVn .

(Dem.: Designa-se  Br=Br(y) .  (1) Da 1ª Fórmula de Green ∫∂D f ∂g/∂n = ∫D [f lap g+(∇f)·(∇g)] , com f=1, g=u, ∫B ∂u/∂n = ∫B lap u =0 (resp., ≥0 , ≤0) . A mudança de variáveis de integração r=||x-y|| e t=(x-y)/r e a Regra de Leibniz dão ∫B ∂u/∂n dVn-1(x) = rn-1||t||=1 (∂u/∂r)(y+rt) dVn-1(t) = rn-1 (∂/∂r) ∫||t||=1 u(y+rt) dVn-1(t) = rn-1 (∂/∂r) [ r1-n ∂Bru ] . Logo, (∂/∂r)[ r1-n ∂Bru ] = 0 (resp., ≥0 , ≤0) , e, para 0<r<R , a função r↦[r1-n  ∂Bru ] é constante (resp., decrescente, crescente) e, portanto, r1-n  ∂Bru (≤, ≥) R1-n ∂BRu . Dividindo ambos os lados por voln-1(∂B) e fazendo r→0 , como a função integranda é contínua, obtém-se u(y)=limr0 r1-n ∂Bru dVn-1 (resp., ≤, ≥) R1-n ∂BRu dVn-1 .

(2) Como voln(B1) = ∫∂B11 dVn= ∫01 ∫∂Br1 dVn-1 dr = ∫01voln-1(∂Br) dr = ∫01 rn-1 voln-1(∂B1) dr = (1/n) voln-1(∂B1) , de (1) , para 0<r<R é  n voln(B1) rn-1u(y) = (resp., ≤, ≥) ∫∂Bru dVn-1 . Integrando ambos os lados em r∈]0,R[ obtém-se voln(B1) Rn u(y) = (≤, ≥) ∫0R ∫∂Bru dVn-1 dr = ∫∂Bru dVn , que é (2), pois voln(B1) Rn= voln(BR) .

Observação: A propriedade de relação do valor num ponto de soluções C2 de equações de Laplace ou de Poisson com as médias em bolas centradas no ponto ou nas suas fronteiras (igualdade no caso de equação de Laplace e desigualdades no caso de equação de Poisson, com sentido dependente do sinal do termo independente ρ da equação, são umportantes e dão informação sobre as soluções fácil de apreender. Além disso têm as consequências seguintes sobre máximos e mínimos das soluções que, em particular, implicam que soluções da equação de Laplace num conjunto aberto limitado C2 no conjunto e contínuas no seu fecho assumem os valores máximo e mínimo (que, do T. de Weierstrass, existem porque o fecho de D é compacto) em pelo menos um ponto da fronteira, e verifica-se o mesmo para o máximo de soluções da equação de Poisson lap u=ρ com ρ≥0 e o mínimo para ρ≤0 (note-se que em 1 variável a equação é u''=ρ e os gráficos de soluções C2 num intervalo aberto e contínuas no seu fecho são segmentos de recta se ρ=0 (equação de Laplace), curvas convexas se ρ≥0 ou curvas côncavas se ρ≤0 , pelo que, resp., extremos, máximo e mínimo ocorrem na fronteira). Em aplicações em modelos de física podems er conhecidos os valores na fronteira, mas não os valores correspondentes no interior do conjunto, pelo que se obtém assim informação útil sobre valores máximos ou mínimos das soluções.

Princípio de Máximo Forte: Seja D⊂ℝn aberto.

(1) Se u é uma função contínua definida num conjunto aberto que em cada bola B com fecho em D satisfaz (2).do Teorema de Valor Médio, ou seja u(y) = (resp., ≤, ≥) [1/voln(B)] ∫B u dVn para ρ=0 (resp., ≥0, ≤0), e existe y∈D tal que  u(y)=supDu (resp., infDu) , então u é constante. 

(2) Soluções C2 da equação de Poisson lap u=ρ em D com ρ≥0 não têm máximo em D (e com ρ≤0 não têm mínimo em D) a não ser que sejam constantes.

(3) Soluções C2 da equação de Laplace lap u=0 em D não têm máximo nem mínimo em D a não ser que sejam constantes

(Dem.: (1) Se u(x) ≤ [1/voln(B)] ∫B u dVpara x∈D , M= supDu e existe y∈D tal que u(y)=M , como u é contínua, a preimagem u-1({M}) é um conjunto fechado relativamente a D . Se z∈u-1({M}) e B=BR(z)⊂D , é 0 = u(z) - M ≤ [1/voln(B)] ∫B (u-M) dV≤ 0 . Logo, u=M em B , pelo que u-1({M}) também é aberto. Como os subconjuntos de um conjunto D⊂ℝn simultaneamente abertos e fechados relativamente a D são D e o conjunto vazio e u-1({M}) não é vazio, é u-1({M})=D, e, portanto, u é constante em D . Se a desigualdade inical que u satisfaz é com o sentido oposto, aplicando o que se provou a –u obtém-se o resultado. (2) é consequência imediata de (1) e (3) de (2).)

Princípio de Máximo Fraco: Seja D⊂ℝn um conjunto limitado e aberto.

(1) Se u é uma função contínua em D que em cada bola B com fecho contido em D satisfaz (2).do Teorema de Valor Médio, ou seja u(y) = (resp., ≤, ≥) [1/voln(B)] ∫B u dVn para ρ=0 (resp., ≥0, ≤0), é supDu = supDu (resp., infD u = infD u) .

(2) Soluções em C2(D)∩C(fecho de D) da equação de Poisson lap u=ρ satisfazem a igualdade de supremos precedente se ρ≥0 e a de ínfimos se ρ≤0 .

(3) Soluções em C2(D)∩C0(fecho de D) da equação de Laplace lap u=0 satisfazem inf∂D u ≤ u(x) ≤ sup∂D u para todo x∈D .

(Dem.: É consequência directa do Princípio de Máximo Forte.)

Observação: Com este resultado obtém-se uma extensão da unicidade de solução em C2(D)C0(fecho de D)  (quando existe) do problema de Dirichlet para a equação de Poisson para D⊂ℝn um conjunto limitado e aberto do resultado obtido na aula anterior (directamente da 1ª Fórmula de Green) só para solução em C2(fecho de D)  para D⊂ℝn domínio regular. Este resultado mais geral também é consequência indirecta da 1ª Fórmula de Green porque usa o Teorema de Valor Médio, mas, como se viu, requer resultados adicionais. A utilidade desta extensão é que para obter condições que garantam existência de solução é importante considerar conjuntos limitados abertos D que não sejam domínios regulares e permitir que a solução não seja C2 e seja só contínua na fronteira, pois para conjuntos com fronteiras que não sejam suficientemente suaves pode não existir solução C2 no fecho de D e existir solução C2 em D e contínua no fecho de D .

Unicidade de solução em C2(D)∩C0(fecho de D) do problema de Dirichlet para a equação de Poisson num conjunto D⊂ℝn limitado e aberto: 

(1) Se u e v são funções contínuas no fecho de D que em cada bola B com fecho em D satisfazem (2).do Teorema de Valor Médio, ou seja u(y) = (resp., ≤, ≥) [1/voln(B)] ∫B u dVn para ρ=0 (resp., ≥0, ≤0) e o mesmo com v em vez de u , e são iguais em ∂D , então são iguais em D .

(2) Soluções em C2(D)∩C0(fecho de D) de uma equação de Poisson lap u=ρ em D que são iguais em ∂D são iguais em D .

(Dem.: (1) É consequência imediata do Princípio de Máximo Fraco.  (2) Se u e v são soluções em C2(D)C0(fecho de D) da equação de Poisson, u-v é solução da equação de Laplace. De (1) no Teorema de Valor Médio, como u-v=0 em ∂D, é u=v em D .)


48ª Aula – Continuação de aplicações do T. Fundamental do Cálculo para funções de várias variáveis: Equação de onda em electromagnetismo. Referência aos três tipos de equações diferenciais parciais de 2ª ordem: elípticas (e.g. em equilíbrio), parabólicas (e.g. difusão) e hiperbólicas (e.g. propagação ou conservação). Fórmulas de Green e aplicação a possível unicidade de soluções de equações de Poisson ou Laplace com condições na fronteira de Dirichlet ou de Neumann (correspondentes a soluções com, resp., valores ou contribuições para o fluxo para o exterior em cada ponto na fronteira (i.e. derivada direccional na normal à fronteira) fixados; no útimo caso se fixada 0 corresponde a impedir o fluxo através da fronteira (e.g. com uma parede bloqueadora em movimento de fluidos, ou um isolante, resp., eléctrico ou témico em, resp., electroestática ou equilíbrio para equação do calor).

21 maio 2020, 13:00 Luis Magalhães

(Não houve aula presencial porque a Direcção do IST decidiu suspender as aulas presenciais devido ao surto de COVID-19. Por isso, a descrição abaixo é bastante detalhada)

Estudo para acompanhamento da matéria: pgs. 180-183 e 156-158 do livro Luis T. Magalhães, Integrais em Variedades e Aplicações, 2ª Edição, Texto Editora, 1999. E exercícios correspondentes.

Equação de onda em electromagnetismo

Supondo E e H C2 e calculando o rotacional de ambos os lados da equação de Maxwell (I*), como para um campo vectorial F C2 em ℝ3, é rot rot F=grad(div F) – lap F, e usando as outras equações de Maxwell e o Lema de Schwarz de troca de ordem de derivadas parciais, obtém-se para um material isotrópico e num conjunto sem cargas eléctricas (logo, com ρ=0 e J=0)

0 = rot rot E+(1/c)∂(rot B)/∂t = [grad(div E)– lap E]+(1/c)∂(rot μH)/∂t = (grad[(1/ε)div D]–lap E)+(1/c)∂(rot μH)/∂t = (4π/ε)ρ–lap E+(μ/c)∂[(1/c)∂D/∂t+(4π/c) J]/∂t=– lap E+(μ/c2)∂2E)/∂t2=– lap E+(με/c2)∂2E/∂t2. Portanto, ∂2E/∂t2-[c2/(με)] lap E = 0 , que é uma equação diferencial linear homogénea de 2ª ordem para o campo eléctrico.

Calculando o rotacional de ambos os lados da equação de Maxwell (II*) obtém-se analogamente ∂2H/∂t2-[(c2/(με)] lap H=0. Nos dois casos cada uma das componentes dos campos eléctrico e magnético satisfaz a equação diferencial escalar  ∂2U/∂t2–v2lap U=0 , com v= c/(με)1/2.

Se U só depende de uma variável escalar x , e.g.. U(x,y,z)=u(x) , a equação é  ∂2u/∂t2–v22u/∂x2=0 , ou (∂/∂t-v∂/∂x)(∂/∂t+v∂/∂x)u=0 , que é uma equação linear de 2ª ordem homogénea que, com w=(∂/∂t+v∂/∂x)u pode ser escrita como um sistema de duas equações lineares de 1ª ordem, uma homogénea e a outra não: (∂/∂t-v∂/∂x)w=0 , (∂/∂t+v∂/∂x)u=w. Um conjunto convexo no plano-xt pode ser preenchido por troços de rectas paralelas com equações cartesianas x+vt=C1, com C1∈ℝ . Da Regra da Cadeia, se w(x,t) e u(x,t) satisfazem as equações obtidas, (d/dt)[w(C1-vt,t)]=-v∂w/∂x+∂w/∂t=0 , pelo que w tem um valor constante h(C) sobre os pontos da recta x+vt=C1, e substituindo na equação para u , (∂/∂t+v∂/∂x)u(x,t)=w(x,t)=h(x+vt) e, com uma função p tal que p´(C1)=h(C1)/2v , da Regra da Cadeia, é (∂/∂t+v∂/∂x)p(x+vt)=vp´(x+vt)+vp’(x+vt)=2vh(x+vt)/(2v)=h(x+vt) , e subtraindo esta equação de equação para u obtém-se (∂/∂t+v∂/∂x)[u(x,t)-p(x+vt)]=h(x+vt)-h(x+vt)=0 . Tal como na equação para w, conclui-se que u(x,t)-p(x+vt) é em pontos de rectas x-vt=C2 com C2∈ℝ uma constante q(C2), ou seja u(x,t)-p(x+vt)=q(x-vt) e, portanto u(x,t)=p(x+vt)+q(x-vt) . f1(x,t)=p(x+vt) corresponde à função em t=0 p(x) propagar-se com velocidade v para a esquerda num referencial em que o eixo horizontal é de x e o vertical é de t e f2(x,t)=q(x-vt) é análoga com propagação para a direita, ou seja as soluções são a soma de duas ondas a propagarem-se em sentidos opostos com velocidade v . 

À equação diferencial escalar 1 variável espacial ∂2u/∂t2–v22u/∂x2=0 chama-se equação de onda, assim como à equação vectorial de 1 variável espacial ∂2U/∂t2–v2lap U=0 e à equação vectorial de 3 variáveis espaciais ∂2E/∂t2-[c2/(με)] lap E = 0 e à que se obtém substituindo E por . Estabelece-se assim a existência de ondas electromagnéticas que se propagam com velocidade v= c/(με)1/2 e, que no vácuo, como μ=ε=1, é a velocidade da luz c . A medida experimental de ondas electromagnéticas foi feita em 1888 por Heinrich Hertz e foi considerada uma das mais convincentes confirmações das equações de Maxwell. Em 1909 Ferdinand Braun e Guglielmo Marconi receberam o Prémio Nobel de Física pelo desenvolvimento de transmissão telegráfica sem fios com ondas electromagnéticas o que, na altura, levou rapidamente a transmissões radiofónicas e mais tarde a muitos outros desenvolvimentos.

Observação: Com o T. Fundamental do Cálculo de várias variáveis reais (T. da Divergência, e T. de Stokes em ℝ3) obtiveram-se várias equações diferenciais parciais lineares importantes, uma de 1ª ordem (a equação da continuidade que traduz conservação de uma grandeza escalar em termos da sua densidade por volume), e quatro de 2ª ordem: equação de Poisson, equação de Laplace, equação do calor e equação de onda. A equação de Laplace é a equação homogénea correspondente à de Poisson, pelo que só são três tipos de equações diferenciais parciais de 2ª ordem. As soluções destas equações têm propriedades muito diferentes, e também são diferentes os detalhes para as resolver, mas são as equações mais simples das 3 classes gerais de equações diferenciais parciais de lineares, chamadas, resp., elípticas, parabólicas e hiperbólicas. Como se viu as elípticas estão associadas a situações de equilíbrio, as parabólicas a difusão como a difusão de calor, e as hiperbólicas a leis de conservação e a propagação de ondas (a equação da continuidade também é hiperbólica, mas é de 1ª ordem). O estudo de equações diferenciais parciais é um tópico importante em Matemática e continua a ter desenvolvimentos importantes, especialmente para equações não lineares. O seu estudo tem estimulado ao longo dos anos avanços significativos em questões centrais da Matemática. 

Fórmulas de Green

Revisão de funções de 1 variável real (CDI1): A regra de derivação do produto para funções reais de variável real C1 em em [a,b] (fg)´=f’g+fg’, integrando ambos os lados dá ∫ab(fg)´= ∫abf’g+∫abfg’ e, aplicando o T. Fundamental do Cálculo obtém-se ∫abfg’= [f(b)g(b)- f(a)g(a)] - ∫abf’g , que é a regra de integração por partes.

Considera-se agora uma fórmula análoga para funções de n variáveis reais e, portanto, para aplicar o T. Fundamental do Cálculo em ℝn (T. da Divergência) considera-se um domínio regular D⊂ℝn e um campo escalar f e um campo vectorial h com valores em ℝn, ambos C1 no fecho de D. Como div(fh)=(∇f)·h+f div g , integrando ambos os lados ∫D div(fh) = ∫D (∇f)·h + ∫D f div h  e, aplicando o T. da Divergência, ∫D f div h = ∫D f h·n - ∫D (∇f)·h , em que n é a normal unitária exterior a D em ∂D, análoga à fórmula de integração por partes para funções de 1 variável real.

Para obter uma fórmula com as duas funções em formas semelhantes, considera-se h=∇g para um campo escalar C2 no fecho de D. Como div ∇g =lap g e  h·n=∇g·n é a derivada direccional de g na direcção e sentido de n , que se designa aqui gn ou ∂g/∂n , obtém-se ∫D f lap g = ∫D f ∂g/∂n - ∫D (∇f)· (∇g) , ou seja ∫D f ∂g/∂n = ∫D [f lap g+(∇f)·(∇g)] , chamada 1ª Fórmula de Green.

Se f e g são ambas C2 no fecho de D a 1ª Fórmula d Green também é válida trocando f com g e subtraindo as duas fórmulas obtém-se ∫D (f ∂g/∂n - g ∂f/∂n) = ∫D (f lap g – g lap f) , chamada 2ª Fórmula de Green.

Proposição: Se D⊂ℝn é um domínio regular com n a normal unitária exterior a D em ∂D e f,g são campos escalares C1 no fecho de D , então:
(1) 1ª Fórmula de Green: Se g é C2 no fecho de D, é ∫D f ∂g/∂n = ∫D [f lap g+(∇f)·(∇g)] .
(2) 2ª Fórmula de Green: Se f e g são C2 no fecho de D, se ∫D (f ∂g/∂n - g ∂f/∂n) = ∫D (f lap g – g lap f) .

(Dem.; Provado acima.)

Se f é campo escalar C2 no fecho de um domínio regular D e é uma função harmónica, i.e. lap f=0 , da 1ª Fórmula de Green com g=f , ∫D f ∂f/∂n = ∫D ||∇f||2 (em aplicações em Física muitas vezes o lado direito é uma energia, a menos de uma multiplicação por uma constante positiva). Em consequência obtém-se os resultados seguintes para soluções da equação (diferencial parcial) de Laplace.

Proposição: Se f um campo escalar solução da equação de Laplace lap f=0 num domínio regular D⊂ℝn que é C2 no fecho de D e n é a normal unitária exterior a D em ∂D :
(1) se ∂f/∂n=0 em ∂D, então f é constante em cada componente conexa de D .
(2) se f=0 em ∂D, então f é f=0 em D .

(Dem.: (1) ∫D ||∇f||2=∫D f ∂f/∂n=0 . Como f é C2, ||∇f||2 é C1, logo contínua no fecho de D e, portanto, ∇f=0 . Portanto f é constante em cada componente conexa de D.
(2) Verifica-se a mesma fórmula inicial e, portanto, f é constante em cada componente conexa de D e na fronteira de cada uma destas componentes tem o valor dessa constante porque é contínua no fecho de D. Como os pontos da fronteira de cada componente conexa são pontos de ∂D, em que f=0 , conclui-se que f=0 em D .)

Proposição (Unicidade de solução de equações de Poisson e Laplace: As soluções de uma equação de Poisson lap f=ρ num domínio regular D⊂ℝn  com ρ:D→ℝ qualquer C2 no fecho de D:
(1) que satisfazem a condição na fronteira  f=u em ∂D, para uma dada função arbitrária (C2) u:∂D→ℝ , são únicas (se existirem).
(2) que satisfazem a condição na fronteira  ∂f/∂n=v em ∂D para uma dada função arbitrária (C1) v:∂D→ℝ , em cada componente conexa de D diferem de uma constante (se existirem).

(Dem.: (1) Se f e g são soluções, f-g também é porque a equação é linear e f-g=u-u=0 em ∂D . De (2) na Proposição precedente, f-g=0 em D.
(2) Analogamente, ∂(f-g)/∂n =0 em D e de (1) na Proposição anterior, f-g é constante em cada componente conexa de D.)

Observações:

(1) A parte (1) deste resultado garante a unicidade de solução em C2(fecho de D) do problema de valores na fronteira para a equação de Poisson lap f=ρ em D, f=u em ∂D, para u uma função arbitrária em ∂D (se existir solução), em que D⊂ℝn é um domínio regular. Este tipo de problema para equações diferenciais parciais com valores na fronteira e valor fixado na fronteira chama-se Problema de Dirichlet para a equação diferencial. É o caso de 1 solução de equação linear, o núcleo da transformação linear f↦(lap f,f|D) do espaço linear C2(fecho de D) no espaço linear C0(fecho de D)xC0(∂D) é {0} (a solução do Problema de Dirichlet para a equação de Laplace lap f=0 em D, f=0 em ∂D é 0 (em que, como usualmente, f|D é a restrição de f a ∂D). Fisicamente, um problema de Dirichlet corresponde a uma situação em que o valor da incógnita na fronteira é fixado, e.g. em electrostática para a equação de Poisson para o potencial eléctrico lap V=-4πρ em D corresponde a fixar o valor do potencial eléctrico na fronteira ligando-o a uma fonte de “tensão eléctrica” V constante (ou “ligando-a à Terra”).

(2) A parte (2) deste resultado garante que as soluções em C2(fecho de D) do problema de valores na fronteira para a equação de Poisson lap f=ρ em D, ∂f/∂n=v em ∂D em ∂D, para v uma função arbitrária em ∂D (se existir solução), em que D⊂ℝn é um domínio regular. Este tipo de problema para equações diferenciais parciais com valores na fronteira e derivada direccional na direcção e sentido da normal exterior unitária n fixado na fronteira chama-se Problema de Neumann para a equação diferencial. É o caso de infinitas soluções de equação linear, se D tem m componentes conexas, o núcleo da transformação linear T:f↦(lap f,(∂f/∂n)|D) do espaço linear C2(fecho de D) no espaço linear C0(fecho de D)xC0(∂D) é o espaço linear de dimensão m das funções constantes em cada uma das m componentes conexas de D (as soluções do Problema de Neumann para a equação de Laplace lap f=0 em D, ∂f/∂n=0 em ∂D  são as funções constantes em cada componente conexa de D. A equação de Poisson tem solução se e só se ρ pertence ao contradomínio da transformação linear e, nesse caso, a solução geral é a soma de uma solução particular desta equação linear não homogénea com todas as soluções da equação homogénea correspondente, que é o espaço linear de dimensão m das funções constantes em cada uma das m componentes conexas de D, pelo que é um plano-m no espaço linear C2(fecho de D). Fisicamente, um problema de Neumann corresponde a uma situação em que a contribuição para o fluxo do gradiante da incógnita para o exterior do domínio é fixado; se é fixado com valor 0 corresponde a não haver contribuição para o fluxo através da fronteira do domínio em qualquer ponto dessa fronteira, e.g. em electroestática para a equação de Poisson para o potencial eléctrico lap V=-4πρ em D, ∂f/∂n=0 em ∂D em ∂D corresponde a isolar electricamente um condutor eléctrico D na fronteira.

(3) O problema de existência de solução para os problemas de valores na fronteira de Dirichlet e de Neumann considerados não é tão directa do T. Fundamental do Cálculo, mesmo para domínios regulares simples.


Exercícios da ficha 12, outros (aula online)

20 maio 2020, 12:00 Manuel Paulo de Oliveira Ricou

Ficha 12: 2, 7

Ficha 2(C): 6
Questões sobre diferenciabilidade e continuidade.
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