Notícias do CERN: As experiências CMS e LHCb revelam novo decaimento de partícula raro com elevada precisão



Num artigo publicado a 13 de Maio na revista Nature, as colaborações CMS e LHCb descrevem a primeira observação do decaimento muito raro da partícula Bs em dois muões. O Modelo Padrão, a teoria que melhor descreve o mundo das partículas, prevê que este processo subatómico raro aconteça em cerca de quatro vezes em cada mil milhões de decaimentos, o qual nunca havia sido detectado anteriormente. A análise é baseada nos dados acumulados no Large Hadron Collider (LHC) em 2011 e 2012. Estes dados contêm ainda indícios de um decaimento semelhante, mas ainda mais raro, da partícula B , parente do Bs.
O B e o Bs são mesões, partículas subatómicas instáveis compostas de um quark e um antiquark unidos pela força forte. Tais partículas são produzidas apenas em colisões a energias elevadas — em aceleradores de partículas, ou na natureza, por exemplo em interações de raios cósmicos. “Este resultado constitui um excelente exemplo da precisão que pode ser alcançada quando experiências combinam as suas medições”, disse Rolf Heuer, Director Geral do CERN. As duas colaborações tinham divulgado os resultados das suas análises individuais do decaimento do mesão Bs em Julho de 2013. Embora os resultados estivessem em excelente acordo, ambos ficavam aquém do nível de precisão estatística de 5 sigma que é historicamente requerido para reivindicar uma observação. A análise combinada ultrapassa facilmente esse requisito, alcançando 6.2 sigma. Esta é a primeira vez que CMS e LHCb analisaram os seus dados em conjunto. "É prova do excelente desempenho do LHC, e da sensibilidade das nossas experiências, termos sido finalmente capazes de observar este decaimento extremamente raro mas importante”, disse Guy Wilkinson, responsável e porta-voz de LHCb. Este resultado emocionante é um marco importante de uma pesquisa conduzida por muitas experiências ao longo de quase três décadas, e tem implicações importantes na busca de novas partículas e novos fenómenos para além do Modelo Padrão, que será levada a cabo com o novo ciclo de colisões do LHC que se inicia nas próximas semanas. "O resultado permite-nos eliminar uma ampla gama de teorias de ‘nova física’, que prevêem taxas de decaimento mais elevadas,” explica Nuno Leonardo, investigador do LIP em Lisboa, coordenador do Grupo de Física do quark b em CMS, e membro da equipa que realizou a análise. “Este é possivelmente o resultado mais emblemático do LHC desde a descoberta da partícula de Higgs. Enquanto que a última beneficiou da energia recorde das colisões, o factor determinante para esta descoberta foi o número imenso de colisões registado pelas experiências. A busca de partículas novas e o estudo de processos raros são estratégias complementares para descobrir nova física, e ambas serão de novo exploradas nas colisões do LHC que vão ser retomadas em breve, com maior energia e feixes ainda mais intensos. Esses dados irão permitir medir com maior precisão as taxas de decaimento do Bs e B , bem como procurar processos ainda mais raros ou que não são permitidos no Modelo Padrão, e poderão vir a revelar a presença de nova física.” Os dados que serão futuramente fornecidos pelo LHC irão aumentar a precisão da medida do Bs e determinarão se os possíveis indícios do decaimento do B vão ser confirmados. Estes resultados serão cruciais para distinguir entre quaisquer sinais de novos fenómenos e efeitos do Modelo Padrão, e irão avançar a busca de nova física. Milhares de físicos estão envolvidos com o LHC numa extensa busca de sinais de nova física que poderá explicar alguns dos maiores mistérios da ciência, incluindo a natureza da matéria escura, e porque razão o universo, tendo começado com quantidades iguais de partículas de matéria e de antimatéria logo a seguir ao Big Bang, é aparentemente composto quase exclusivamente de matéria. Portugal participa na experiência CMS em LHC desde o seu início através do LIP e do Departamento de Física do IST tendo já contribuído de forma decisiva para o calorímetro electromagnético de CMS bem como para outras análises de física incluindo a descoberta do bosão de Higgs (que levou à atribuição do Prémio Nobel da Física em 2013 a Peter Higgs e François Englert). A equipa portuguesa é liderada pelo Prof. Doutor João Varela, do LIP e Instituto Superior Técnico, que foi “Deputy Spokesperson” (vice-responsável) da Colaboração CMS nos anos 2012 e 2013. Nuno Leonardo do LIP coordena o grupo de física do quark b em CMS desde 2014.

Informação adicional: O mesão Bs consiste de um antiquark bottom e um quark strange. O mesão B consiste de um antiquark bottom e um quark down. Estas partículas têm propriedades muito interessantes. Por exemplo, possuem um tempo de vida médio superior à maioria das outras partículas instáveis produzidas nas colisões, deslocando-se vários milímetros no interior do detector antes de se desintegrarem (o que permite identificá-las). Durante este período, oscilam espontaneamente entrepartícula e antipartícula — no caso do Bs, estas transições ocorrem três biliões de vezes por segundo (tese de doutoramento de N.Leonardo, MIT, colaboração CDF, 2006). O Modelo Padrão (da Física de Partículas) prevê que as probabilidades para os mesões Bs e B0 decaírem em dois muões são muito pequenas, apenas cerca de quatro vezes em cada mil milhões e uma vez em cada dez mil milhões, respectivamente. No entanto, elas podem receber umimpulso em teorias “para além do Modelo Padrão", incluindo aquelas com mais de um bosão de Higgs, tais como a supersimetria. Os resultados combinados de CMS e LHCb estão de acordo com o Modelo Padrão e ajudam a eliminar ou restringir uma série de modelos de nova física. A análise combinada é baseada num ajuste comum aos dados das duas experiências, o que é feito pela primeira vez, e envolveu um tratamento rigoroso das correlações e das incertezas sistemáticas. Para além disso, envolveu também uma mudança de perspectiva, uma vez que as duas equipas estão geralmente em competição amigável uma com a outra. No entanto, este novo resultado mostra o empenho das colaborações em explorar conjuntamente os seus dados na busca de nova física.

Artigo escrito a partir de nota de imprensa do LIP